Multiplicando Desejos: Liberdade

13 maio

Era uma vez uma guriazinha que queria ser jornalista. Ela acreditava que podia mudar o mundo com suas reflexões sobre a vida, o universo, e tudo mais. Um dia, percebeu que esse mesmo mundo não estava muito interessado nas suas teorias libertárias, ainda mais se estas fossem difundidas nos grandes meios de comunicação.

Pois bem. A garotinha decidiu ser professora. Imaginava que, mesmo não modificando o pensamento das pessoas em larga escala, pensou que poderia mudar um pouquinho aqueles que a cercavam. Naquela altura da vida, já estava de bom tamanho.

Fez faculdade de História, se empenhou em ser uma excelente aluna, entrou em contato com discussões sobre feminismo e gênero, e, sabe-se lá por que, acreditou que poderia ser alguém que fizesse a diferença novamente. Mas as barreiras se impuseram, pesadas. “Isso não é História!” – diziam alguns professores. “Vá achar outra pesquisa!” – anunciavam outros.

Mas a menininha foi persistente. Seguiu com sua ideologia e estudou aquilo que gostava. Sua perseverança lhe rendeu uma vaga no Mestrado – em História! Interessante… Ali ela pode devanear um pouco mais. Mas quem faz/fez parte do mundo acadêmico cientificista sabe o quanto esses pensamentos oníricos podem custar.

Tudo bem. Não estava ali para agradar ninguém mesmo. Ninguém além dela mesma. A garotinha – que agora já não era mais tão pequena assim, ao menos em tamanho e idade – seguia em frente. Já não via a hora de exteriorizar seus pensamentos para uma turma de alunos, que, imaginava ela, estariam interessados em suas proposições.

Ela aceitou o desafio e partiu para o mercado de trabalho. Foi exercer a profissão que tanto gostava de estudar. Mas percebeu que pesquisar sobre aquilo era muito mais interessante do que o exercício diário de sua escolha.

Ninguém estava interessado no que ela tinha a dizer. Pelo contrário. Enquanto ela achava que poderia difundir práticas e pensamentos de igualdade entre os sexos, os alunos dividiam a turma entre Irã e Iraque. Uns representados pela masculinidade latente e institucionalmente aceita e a outra “facção” pelas garotas da “turma”.

Mas a guriazinha pensou que aquilo tudo era um exercício de paciência e perseverança. Estava enganada novamente. Até porque, sendo também uma menina, foi inserida na segunda parcela. Na “segunda categoria” de humanidade. Mulheres.

Estando já quase sem esperanças, a garotinha decidiu fazer um curso menos científico e mais artístico. Entrou para a faculdade de Moda. Acreditava-se realizada com sua nova escolha, afinal, ali sim ela poderia explorar sua criatividade e, quem sabe, finalmente ser livre das amarras que ainda a prendiam.

Ali ela poderia juntar toda a teoria anteriormente aprendida e concatená-la com o universo fashion. Bom demais para ser verdade. Já imaginou sua primeira coleção, inspirada nas feministas e/ou nas discussões de gênero. Se Moda é um reflexo da sociedade, a menininha ia refletir o que bem entendesse, e divulgar suas ideias através de roupas.

Encontrou colegas e amigas que compartilhavam esses sonhos e assim formaram uma equipe animada e esperançosa.

Mas ali, também, não puderam exercer sua liberdade. Foram tolhidas pelo sistema e tiveram que se adaptar, mais uma vez.

No entanto, a guriazinha segue em frente. Ela e muitas das pessoas que encontrou pelo caminho. Algumas acabaram desistindo, pois é árduo nadar contra a corrente.

Ela não tem mais a pretensão de mudar o universo, e nem mesmo todas as pessoas ao seu redor. O que ela deseja, com todas as suas forças, é, apenas, ser livre. Liberdade para criar, para ser, para estar no mundo. Livre para sonhar, para tentar, para desistir e começar novamente, se assim for necessário.

Agora, me respondam: será que esta garotinha (ruiva) está sonhando demais?

Beijocas no ♥.

*Todas as imagens foram retiradas do We♥It.

39 Respostas to “Multiplicando Desejos: Liberdade”

  1. Rafa Gizzi maio 13, 2011 às 10:11 #

    Não é sonhar demais não. É sonhar sozinha.
    Sozinha a gente não aguenta nada.

  2. Miqueline Silveira maio 13, 2011 às 10:15 #

    Fiquei sem palavras. Nós entramos nesse clima de “revolução” mas infelizmente a repressão falou mais alto e o que ainda falou mais alto foi o pensamento medíocre. Talvez seja esse pensamento que acaba delimitando tanto a criação. No mais, lindo texto e lindos pensamentos Ana, sou tua fã já te falei isso né?

    • Ana Luiza maio 13, 2011 às 10:16 #

      Pois é, triste demais.
      Um grande beijo, colega de debates e questionamentos! 😉

  3. Leka maio 13, 2011 às 10:29 #

    Não sei nem o que dizer, tem uma colega minha que faz moda e sociologia, apesar das criticas que ela recebe, eu acho que tem tudo a ver.

    e não pense que é vc que sonha demais, é o mundo como está posto hoje que não consegue absorver os sonhos mais libertarios e mais ideologizados.

    No mais, se quiser procurar uma terceira formação, vc será muito bem vinda nas ciencias sociais 🙂

    • Ana Luiza maio 13, 2011 às 10:44 #

      Hummm, acho que as Ciências Sociais entram no mesmo nicho da História… hehe
      E tb acho que Moda e Sociologia tem tudo a ver. Mas sempre terá alguém para criticar. :/

  4. Adriana Oliveira maio 13, 2011 às 10:47 #

    Conheço bem algumas dessas frustrações… sou formada em Ciências Sociais e a minha pretensão de refletir sobre este mundo nunca foi muito levada a sério. E as contas começaram a chegar, implacáveis…

    Será que dá pra refletir sobre algo tão esquizofrênico quanto esse mundo que a gente vive? Nessa altura da vida – 34 anos – chego a conclusão que não. O jeito é viver, fazendo o que se gosta, mesmo que seja fora do horário comercial, e tentando contribuir, ainda que seja aos pouquinhos, pra uma vida mais doce e mais bonita pra nós mesmos e nossos sobrinhos, filhos, netos…

  5. Natalia Sauer maio 13, 2011 às 11:31 #

    “O que ela deseja, com todas as suas forças, é, apenas, ser livre. Liberdade para criar, para ser, para estar no mundo. Livre para sonhar, para tentar, para desistir e começar novamente, se assim for necessário.” (adorei)

    A vida é sempre um recomeço Ana.. Os maiores artistas são aqueles que lutam contra a corrente.. pensa nisso. Se tu acredita que a tua inspiração parte destes ideais, faça ela valer, só não esqueça que a moda conceitual tem que gerar uma moda comercial e ter um público alvo apto a consumi-la. Se grandes estilistas não tivessem lutado contra barreiras, contra a corrente e contra o sistema, não teríamos grandes nomes na moda, como chanel, McQueen, entre muitos outros..
    Conta comigo sempre!
    Natt

  6. karina braz nogueira maio 13, 2011 às 16:55 #

    muito bom o texto, não tenho muito a dizer, porque pra mim seu texto ja falou tudo. Mais mesmo assim, espero que a garotinha ruiva continue sonhando, porque são os nossos sonhos e ideais que fazem a gente ser o que é. E essa garotinha ruiva pode não ter mudado o mundo, mais posso dizer a ela, que ela mudou muitos dos meus pensamentos.

    • Ana Luiza maio 13, 2011 às 17:04 #

      Obrigada pela força, Karina, de verdade!
      Beijão

  7. Gus maio 13, 2011 às 18:40 #

    Belo texto Ana. Produção sem liberdade não é criação é simplesmente reprodução… O teu pensar diferente é o teu grande trunfo. Segue teu caminho com fé e força, pois a estrada vai além do do que se vê!

    • Ana Luiza maio 13, 2011 às 18:53 #

      ADORO quando os Eternos comentam aqui. Muita saudade de tí!
      Beijocas

  8. Alinne Marques maio 13, 2011 às 19:00 #

    Lindo texto querida!
    Liberdade, esperança, evolução!
    Sempre em busca de algo melhor.
    Adoro-te!
    Bjo

    • Ana Luiza maio 13, 2011 às 19:16 #

      Beijão, e obrigada por estar sempre presente por aqui!

  9. Tati maio 13, 2011 às 21:58 #

    Não estás sonhando demais, não. Sei como é difícil o caminho… manter nossos ideais, tem consequências. Mas lutaremos contra estas, nadaremos contra a corrente, e seguiremos acreditando em nossas escolhas, ideias, vidas… acredito que esse é o caminho para a felicidade (momento clichê mas verdadeiro) rs
    Força, companheira 🙂
    “We Can Do It”
    Mts beijos, LUV U.

    • Ana Luiza maio 13, 2011 às 22:14 #

      Tu é uma “daquelas pessoas que não desistiram e continuam seguindo em frente”. Te amo demais!
      Beijos para minha colega feminista e uma das pessoas mais doces que conheci, apesar da aparência de marrenta. 😛

  10. Pricilla maio 14, 2011 às 0:22 #

    O problema não é de quem -aparentemente- parece estar sonhando demais. O problema é que aqueles que perderam a capacidade de sonhar e realizar seus sonhos acabam querendo extinguir o mesmo desejo que antes tinham e que agora não suportam ver nos outros.
    Ser contra a corrente pode ser muitas vezes solitário, difícil e na maioria das vezes ninguém está “nem aí”. Mas acredite, alguém vai ligar. Sempre dá pra mudar uma pequena parte do universo 🙂
    bj

    • Ana Luiza maio 14, 2011 às 8:58 #

      Pois é prima, acho que o problema é bem esse, ainda mais na academia. Parece que não querem nos ver crescer, pois depois competiremos com eles… :/
      Beijão, e força pra tí também!

  11. Letícia maio 14, 2011 às 1:58 #

    querida, já tinha “conversado” um pouquinho com vc pelo twitter… eu te entendo demais e sei que dá vontade de desistir, mesmo. quem vai na contramão do mundo, não se vende aos ideais dominantes, vai levar mesmo muitas “chicotadas” da vida! infelizmente.

    tb sou feminista, e engajada, ultimamente. sei o quanto a luta é cruel. qdo se trata de lutar pelo direito das mulheres, muitas vezes a gente perde o apoio até mesmo daqueles em que mais confiamos. gente que ergue o braço junto pra brigar por certas coisas, gente POR QUEM a gente briga sem nem ter nada a ver com a história… mas pra mulher tá sempre tudo muito bem, tudo muito bom, né? quem se importa? estamos todas felizes, tá tudo conquistado! ¬¬

    mas não desista, nunca! essa briga vale a pena comprar. eu, pessoalmente, sigo o exemplo do meu querido professor de história do ensino médio, que dizia: “se uma pessoa nesta classe, apenas uma, parar para refletir, questionar ou quiser mudar certa coisa, eu não terei falhado!” e é assim mesmo. dar aulas é assim… pode crer que alguém te ouve. agora, os trabalhos que têm que lidar com mercado e demanda são cruéis, mesmo. mas lembre-se da Coco Chanel… 😉

    (deve estar repleto de erros, escrevi com sono! rs)

    • Ana Luiza maio 14, 2011 às 9:01 #

      É Letícia, essa vida de feminista é dureza…
      Sei que o mercado é cruel, mas na faculdade é justamente onde poderíamos extravasar, e não poderemos. Triste…
      Beijos

      • Letícia maio 14, 2011 às 16:02 #

        pff… faculdade? já perdi essa ilusão. faça o melhor possível e tente não se intimidar com os obstáculos… pq faculdade é lugar de hierarquia e de imposição, infelizmente =/ isso acontece tanto no nível dos docentes qto no dos discentes! :S

        • Ana Luiza maio 14, 2011 às 16:35 #

          Pois é, mas se não for agora, no mercado de trabalho é que não será. Infelizmente.

  12. Rafaela Miss little Cherry maio 14, 2011 às 11:23 #

    Adorei o post! E acho que ele reflete o pensamento de muitas pessoas! Fiz o caminho inverso, sonhando primeiro com o universo fashion onde poderia expor as minhas ideias. Agora ainda estou na fase do jornalismo e, através dele, ainda acredito que posso mudar o mundo! Continuemos a luta diária de quem sabe fazer um lugar melhor para todos 😀

    Beijokas
    http://www.misslittlecherry.wordpress.com

  13. Blog Chá com Cupcakes maio 14, 2011 às 12:15 #

    Post maravilhoso

    bjs e bom fds

  14. Michelle maio 15, 2011 às 0:04 #

    Não é que você está sonhando demais ou sonhando sozinha. Os outros é que não tem coragem de admitir que também sonham. Porque admitir isso é admitir que desejos existem e que ainda não foram realizados. E pra algumas pessoas isso dói. E dói nelas ver alguém – como você – sonhando e buscando o que elas não conseguem. Por isso saiba que só pela sua atitude, você já inspira algo nos outros. E pelo que entendi, é tocá-los de alguma forma que você quer. 🙂

    sempre leio seu blgo, mas nunca comentei. mas senti vontade hoje.

    beijos :*

    • Ana Luiza maio 15, 2011 às 19:02 #

      Comente sempre que quiseres, Michelle, fico muito feliz com sua presença aqui! =*

  15. Caschu maio 17, 2011 às 17:37 #

    Sua vida parece com a minha… Na verdade, nos parecemos até fisicamente! rs

    Eu ainda não decidi o que fazer, nem sei se tenho forças/ânimo para seguir tentando por tanto tempo. Mas já me alegro em saber que existem pessoas no mundo que têm! 🙂

    http://www.tolamaravilha.blogspot.com

    • Ana Luiza maio 18, 2011 às 15:28 #

      Força, Caschu! Muita sorte na área que escolheres!
      Beijão

  16. Tau! maio 17, 2011 às 20:44 #

    Ah, Ana, que bom saber que existem outras sonhadoras como nós por aí para somar – e distrair, rsrsrsrs =D Vc sabe que sempre dou uma passadinha aqui para conferir as novidades e ler que começou a estudar moda foi uma notícia muito inspiradora! Nunca é tarde demais para perseguirmos nossos sonhos – e nunca será cedo demais para desistir deles! Claro que precisamos de apoio, mas o principal mesmo é confiar em si! As instituições desdenham qualquer projeto que desafie os padrões vigentes, nesse meio há de se ter muito jogo de cintura para revolucionar, sacudir mesmo, a opinião pública! Eu concordo com vc, a moda não pode deixar de ser uma forma de nos posicionarmos em relação ao mundo! Chega de futilidade, de ‘modismo’, há que se ter um compromisso com a posteridade! E vc tem, Ana 🙂 Com certeza! Só pela sua intenção vc já está de parabéns! Espero que realize-as nessa nova jornada, onde a ‘senhora’ já aporta com grande bagagem, hã? Olha que vantagem =D Hahauhauhauha! Agora é transformar esses sonhos em realidade! Descobrir o ‘jeitinho’ todo seu de fazer isso e mãos à obra! Existem formas e formas de se dizer uma coisa, e se o discurso incomoda, recorra à alguma outra linguagem, baby! Descubra meios de expressar o que vc quer dizer, recorra ao seu repertório histórico ;^) Tenho certeza que vc não vai esmorecer! Avante colega!

    Bjs! Thaís ;^*

  17. Débora junho 5, 2011 às 23:55 #

    Quanta emoção. Seu post caiu como uma luva para o dia de hoje, vc nem imagina o quanto. Muito obrigada!!!

Deixar mensagem para Débora Cancelar resposta